21 de set. de 2013

Novo de novo

Terceiro polo calçadista do País, depois do Vale do Paranhana e o Vale dos Sinos, no Rio Grande do Sul; e da Região de Franca, Jaú e Birigui, em São Paulo, a Região do Cariri abriga aproximadamente 250 empresas. Dessas, cerca de uma dezena usa matéria-prima proveniente do lixo. Segundo Victor Cunha, gerente industrial do Grupo do qual faz parte a Kinccal, localizada em Barbalha, distante 564 quilômetros de Fortaleza, só essa unidade produziu seis milhões de pares em 2012. Além de calçados de PVC, material plástico produzido a partir do cloro e da soda cáustica, a empresa recicla PE de alta e de baixa para fazer mangueiras.

A matéria-prima - aproximadamente 400 toneladas mensais - provém de capitais nordestinas, como São Luís, Fortaleza, Natal e Recife, estimulando o crescimento do mercado da reciclagem na região. E só essa unidade gera aproximadamente 400 empregos diretos. São 700 no grupo todo.

Logo no início do processo, o material é lavado, mas toda a água empregada é reutilizada e os sólidos são reaproveitados na agricultura. É, então, separado por cor, para otimizar o uso de corantes, e moído duas vezes - durante a noite para pegar a tarifa de energia mais barata - e recebe os aditivos para entrar na linha de produção de fábrica.

Segundo as informações de Cunha, o gasto de R$ 5 em matéria-prima virgem corresponde a R$ 2 no caso do material proveniente do lixo, o que demonstra a viabilidade econômica do negócio. Ele reconhece que, caso as cidades mais próximas fizessem coleta seletiva, o negócio seria ainda mais lucrativo para todas as partes envolvidas, com a redução nos custos do frete.

A Kinccal produz 78 modelos de calçados femininos, masculinos e infantis. São aproximadamente 20 mil pares por dia. A produção emprega, no mínimo, 150 toneladas de material reciclável por semana. Com 35 anos de existência, a empresa já atuou em outros ramos, mas sempre reciclou.

Santos

Embalado pela forte religiosidade da Região, outro filão explorado pela empresa, já há dez anos, é a produção de imagens de santos de PVC. Por enquanto são 50 imagens diferentes, pintadas a mão nas casas de aproximadamente 300 pessoas com dificuldades de locomoção.

Sacolas

Arrumador, porteiro, vigia, garagista, servente, operário. Foram muitas idas e vindas entre Sobral, Fortaleza, Rio de Janeiro e Brasília. Disposição para trabalhar nunca faltou, mas a falta de escolaridade pesou e Expedito de Souza, 48, encontrou, finalmente, um porto seguro em sua terra natal, Forquilha, município vizinho a Sobral, na Região Norte do Ceará, a 215 quilômetros de Fortaleza.

Há sete meses ele trabalha na seleção dos plásticos que chegam à Recoplast, empresa de reciclagem de sacos fundada há quatro anos naquele município. Indiferente à sujeira ou ao mau cheiro dos sacos, rapidamente adquiriu o traquejo para selecionar o que vai e o que não vai para o processo de reciclagem, que consiste em moagem, lavagem, secagem, aglutinação, extrusão, moldagem e corte. "Se a gente coloca esse aqui, prejudica o desempenho da máquina", afirma, referindo-se ao momento em que o saco é cheio de ar para ficar na posição ideal para o corte.

Lá na outra ponta está Lecilda Linhares, 35, que deixou o emprego em uma fábrica de calçados, em Sobral, há um ano, pelo trabalho no acabamento das sacolas, onde estão empregadas as únicas cinco mulheres da fábrica. A justificativa é simples: "as mulheres são mais criteriosas e cuidadosas que os homens", explica o auxiliar administrativo Newton Cavalcante.

A despeito do calor e do barulho dentro da fábrica e também do preconceito das outras pessoas com o mercado da reciclagem, ela está muito feliz: "Me orgulho muito do que faço e pretendo continuar enquanto me quiserem por aqui. Esse é um município muito carente de emprego e, trabalhando aqui, deixei de pagar transporte. Venho todo dia de bicicleta".

Pioneira na região, a Recoplast produz 80 mil quilos de sacolas plásticas por mês a partir de 200 toneladas de restos e polietileno de baixa densidade retiradas do lixo da Zona Norte do Ceará e mais Piauí, Maranhão e Rio Grande do Norte. E o auxiliar administrativo Newton Cavalcante, que trabalha no local há dois anos e meio, foi categórico: "se recebêssemos mais matéria-prima, teríamos mais empregos, porque demanda pelas sacolas no mercado tem e muita". O trabalho é duro, mas tudo é feito de acordo com a lei e os trabalhadores exercem jornadas médias de 8 horas, em três turnos, até atingirem suas metas diárias.


Fonte: Maristela Crispim - Diário do Nordeste 
 
 

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